Esse é um perfume que tive que voltar várias vezes para “entender”. Lolita Lempicka chama atenção por não pular na sua cara implorando amor, mil flores e frutas e algodão doce atacando “você tem que me amar! você tem que me amar!”, aquele jeito Felícia de ser. É mais canto da sereia, vem, vem. Na verdade não tem nada para entender, o perfume é bom demais e que mais se quer?
Imagem: Georgia O’keeffe, Purple Leaves (editado)
Aqui o sucesso é o mesmo da boa caipirinha: nem uma grama de açúcar a mais e economia de meios, senão vira batida. O foco é no anis e no alcaçuz com essa dose precisa de doçura. Na saída o anis tem destaque, combinado com violeta (a flor) e com o tempo cresce o alcaçuz, com um ângulo amargo que as vezes lembra plástico ou coisas perigosamente tóxicas e não comestíveis — a gente gosta de ficar confuso sem saber se é de comer ou não é. No fim o leve amargo e esse jeito de não-pular-na-cara se juntam para dar um certo mistério. Ele também tem uma nota verde sutil que dá um contraponto de frescor.
Depois de várias horas aparece um chocolate discreto com um pouco de amêndoa, bem rente a pele e um pouco talcado. Enquanto Angel é legal pelo ultraje, a piada suja de fazer corar, no Lolita Lempicka a régua está no melhor ponto entre alguma seriedade e ser absolutamente delicioso, jogando no campo perigoso do perfume de sobremesa. Desse jeito misterioso. Vem, vem.

Felícia, a não Lolita
Já rasguei uma seda no Facebook mas vou repetir: obra da minha perfumista favorita, Annick Ménardo, de Bvlgari Black, Diesel Fuel For Life Her e Him, Body Kouros, para citar alguns. O perfume tem ótima fixação e rastro.