Jean-Claude Ellena, perfumista exclusivo da Hermès, se orgulha de trabalhar com uma palheta pequena de matérias-primas, tanto à disposição no laboratório quanto no perfume pronto. Se considera acima de tudo um ilusionista, que recria fragrâncias que existem na natureza com centenas de moléculas com o que a tecnologia permite. Ao longo do tempo essa economia de recursos, não de criatividade e maestria, vai se tornando o estilo de Ellena, que busca composições cada vez mais limpas, legíveis e translúcidas.
Dá para dizer que isso atinge o auge na série Hermessence, criada em 2004. São nove perfumes vendidos exclusivamente nas lojas da marca — ele os chama de haikus, como a poesia concisa japonesa. Nessa linha específica o resultado as vezes é tedioso, mais para exercício conceitual que perfumaria, tão cristalino e puro que já foi dito que poderia ser rotulado Vodka. Enfim o feitiço passou, Ellena lançou no fim de 2012 um floral enorme chamado Jour d’Hermès. Afinal gênio não tem estilo. Estará disponível na loja brasileira em março. Pelos comentários é um bouquet de flores, sem destacar nenhuma específica, que resenho quando conseguir uma amostra.
Voyage gira em torno do cardamomo, chamada especiaria fria no jargão da indústria, que tem facetas de chá, floral e de laranja. Em ataque tende mais para a delicadeza de um floral que para o cortante do cítrico. A especiaria é um perfume sozinho, encantador, aparece aromatizando gin e balas, como as Pastiglie Leone que tive a sorte de ganhar da amiga Elza Tamas.
Ellena já tinha explorado essa nota no Déclaration (Cartier), junto com cominho, que resenho amanhã. Voyage evolui de modo bonito, se revelando devagar. Abre discretamente com uma nota contida de raiz de íris, alguns minutos depois aparece o cardamomo. As facetas se alternam, primeiro o aspecto chá é evidente, delicado e floral. Depois o cítrico cresce, reforçado por uma nota de laranja que persiste até a secagem. Resta então uma madeira discreta, polida, muito confortável. A impressão total é arejada, clara, ampla e luminosa, bem equilibrada entre o frescor delicado e a madeira.
Pingback: Déclaration (Cartier) | 1 nariz()
Pingback: Un Jardin Après la Mousson (Hermès) | 1 nariz()
Pingback: Resenha: Un Jardin sur le Toit (Hermès) | 1 nariz()
Pingback: Livro: Journal d’un Parfumeur, Jean-Claude Ellena | 1 nariz()
Pingback: O sal e um caminho para escapar do doce: Sel de Vétiver, The Different Company | 1 nariz | é sobre perfumes()
Pingback: Falando perfumês: madeiras e o vetiver | 1 nariz | é sobre perfumes()
Pingback: Jean-Claude Ellena em São Paulo: Um livro, Épice Marine e outras histórias | 1 nariz | blog sobre perfumes e resenhas()