Resenha: Black, Comme des Garçons

Tenho um pouco de problema com tudo que é exageradamente conceitual. A linha de corte é a obra parar em pé sem o manual de instruções — a própria coisa tem que despertar o interesse antes que um discurso ponha sentido. A partir daí saber das intenções por trás só aumentam a beleza. Aqui o assunto é perfume, que precisa ser usado, vestido, para ficar inteiro. Corta a cena para Comme des Garçons Odeur 53.

Quase desaparece na pele e é tão inidentificável, no sentido de que some, não de que é estranho, a ponto de ficar a pergunta: precisa? Então a bula: “Um anti-perfume abstrato. Frescor do oxigênio, dunas de areia, ar puro da montanha, esmalte”. Corta para Black, lançado pela marca no início desse ano. Ao que parece a intenção é fazer algo apenas ótimo, o site da marca não entra em intenções conceituais. É um preto sobre preto olfativo: alcaçuz, pimenta do reino, alcatrão, o próprio objeto expõe o conceito.

Alcaçuz, se gustativamente ele é ame-ou-odeie — eu odeio, uma amiga acha que é o gosto da morte — no nariz é bem mais interessante. Tem um aspecto caramelado, ou seja, adocicado e com alguma coisa que cola no dente, mais uma faceta defumada. Alcatrão em doses cavalares lembra cheiro de caminhão, óleo de motor, asfalto quente, é bem presente em perfumes que caminham pelo couro, especialmente os mais amargos e mau encarados como Aramis e Robert Piguet Bandit. Em Black o alcatrão é evidente na abertura, reforçando o lado enfumaçado do alcaçuz. A pimenta do reino acompanha o tempo todo, dando uma textura de madeira, pontilhada, como oposição ao etéreo da fumaça e ao adocicado do alcaçuz. Nunca a chega a ficar opaco ou sufocante como o nome e as demãos de tinta fazem parecer. Junto com Bulgari Black, Chanel Sycomore, Guerlain Derby, vai para a seção de perfumes de fumaça. É delicioso.

Black, Comme des Garçons

Black, Comme des Garçons.
$100 dólares, 100 ml

Disponível via internet.

http://comme-des-garcons-parfum.com/