Resenha: Tubereuse Criminelle, Serge Lutens

Florais limpíssimos tipo Acqua di Giò até são bonitos mas gelados como um interior desenhado pela arquiteta iraquiana Zaha Hadid. E tão “sem defeito” que o resultado é meio maníaco, tipo a dona de casa dos anos 50 passando álcool nos pratos, obsessiva por limpeza e perfeição.

O jasmim, depois da exuberância floral, passando do bonito, tem cheiro de esterco, com quem divide algumas moléculas. Mas é a tuberosa, a nossa angélica, é a que mais impressiona. Primeiro pela potência intoxicante: não adianta correr, resistir é inútil. Em seguida faça o mesmo exercício, depois do bonito tem cheiro de camembert, de borracha, plástico, terra molhada, de côco — e é favor lembrar que flor é órgão sexual.

Serge Lutens

Serge Lutens

Tubereuse Criminelle começa com um zoom no feio, ensombrecendo um plano para destacar outro. Abre com uma explosão gelada, de cânfora, que vai se transformando num cheiro de derivado de petróleo, algo entre borracha e plástico dos mais vagabundos, próximo da agressividade química da creolina (menos o cheiro de bosta). O nome é preciso. E lentamente a flor vai aparecendo dessa treva, enorme, comedora de gente. Rastro e duração comparáveis a do césio-137.

Me parece que todo mundo que gosta de perfume, se não adota Serge Lutens para a vida, tem pelo menos uma fase de adoração. Não sei se estou amando mas com certeza estou apaixonado.

 

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  • lili

    Achei que fosse minha imaginação, que o jasmim(adoro) depois ficasse com cheiro desagradável.. Por favor, fale alguma coisa sobre o Fracas de Piguet.

    • Dênis Pagani

      nada, tá lá, cheiro de esterco, o nariz não se engana! me arrumaram um óleo de jasmim que é plástico + esterco puros. daí entra a maestria do perfumista tbm, não é só engarrafar um absoluto de jasmim e pronto, o processo de obtenção desbalanceia o cheiro, tem que reconstruir.

      • Dênis Pagani

        esqueci do assunto dois: falo do Fracas, sim, um clássico, ao que parece bem reeditado. vou por no meu lote de amostras!

  • Engraçado que só o meu marido nota a pegada suja do jasmim nos meus perfumes. Eu não. E ele não dá a mínima pra perfumes. Eu sim. rs
    Ou sou doida, ou meu nariz não presta, ou sou chegada num cheiro de cocô e não sei. Ou é tudo isso junto. rs

    • Dênis Pagani

      haha! é ruim mas é bom! super acontece aquele efeito de estar tão na cara que a gente não enxerga, tipo procurar o óculos com ele em cima da cabeça, sabe? uma hora vai.

  • Pingback: Notas de Paris: Os domínios de Serge Lutens, La Myrrhe e Iris Silver Mist | 1 nariz | é sobre perfumes: resenhas, guias e mais.()

  • lili

    Graças ao 1nariz descobri que todos os perfumes que me apaixonam TEM que ter tuberosa.

  • Guto

    Descrição muito boa Dênis, acho que o charme de uma boa fragrância é esse bom/ruim, limpo/sujo. Acho essa nota podre do jasmim particularmente charmosa, não porque lembra …, mas porque me lembra aquele cheiro assustador que as flores têm quando secam em um vaso sem água, de tão feio torna-se dramático e belo. Ri muito com a comparação do rastro e duração ao césio 137. Legal. Demorei dias para conseguir ler esse post, tenho medo da “Dona Tuberosa”. Namorei uma garota que usava Amarige e outros tuberosos; o fim do relacionamento foi um soco nas partes baixas, companheiro! Sofri alguns anos ao sentir essa nota. Mas depois entendi que é justamente essa nota que dá a “liga”. Não é à toa que ela é chamada “dentre as flores, a prostituta”, realmente é um cheiro que desperta luxúria.

    • Guto, tenho um amigo que tem essa queda por flores velhas, é o que o encanta em um floral — e uma amiga tbm, a mesma coisa, quando detecta essa decadência se apaixona. ainda não detectei uma nota particular para quando eles falam isso (nunca foi falado de um jasmin, por exemplo) mas sigo prestando atenção.

      Amarige não consigo gostar! é exagerado de um jeito não-bom, vulgar, prefiro a intoxicação de mamutes como Poison e a própria Criminelle, que me trazem algum charme vamp. Agora, perfume de ex é sempre um capítulo a parte…

      • Guto

        E não é! Mas olha o Amarige nela até ficava bem decente, tanto que demorei para saber que era ele, o infame, adquiria um tom mais frio, acho que por causa da pressão baixa que ela tinha, não sei, coisa de pele mesmo. Nem a propósito, tem uma ex minha agora no face me perguntando porque nunca mais falei com ela… Duro.

        • Guto

          Ah, o que dizer da intoxicação vamp de Poison, inebriante!

  • Tubereuse Criminelle foi meu primeiro contato com Serge Lutens e fiquei assombrado, li tanto à respeito das criações dele que não pude ficar indiferente, a saída me assustou bastante, algo que me lembrou a naftalina, um cheiro antigo, empoeirado quase tive vontade de lavar logo minha mão, mas esperei por mais uma meia-hora e aí a surpresa aconteceu e comecei a sentir a tuberosa e o jasmim e esqueci aquela saída estranha, incômoda. Agora fiquei curioso em conhecer outras criações dele.

    • Dino, a saída dessa tuberosa é medonha mesmo, dá vontade de sair correndo — mas vale esperar. fica lindo no verão, se usado com muito cuidado, de um jeito que vc sinta, mas não o tempo todo. não deixe de conhecer Jeux de Peau, que lembra uma fornada de pão saindo, com um caramelado/tostado que é lindo e La Myrrhe, brilhando de mirra e aldeídos.

  • Verinha

    indiscutível a “proximidade” com o perfume da MADONNA.Provem antes e observem o que digo. Tenho os dois, por esse motivo é que escrevi.

    • Verinha, os dois são tuberosas, a mesma flor, cada um no seu estilo.

  • Roberson Guimaraes

    Dênis: algum Sege Lutens é mais ‘masculino”? Ainda que essa definição por gênero de perfume me faça cada vez menos sentido (uso sem medo Cour de Russie e LeLabo Rose31).