Pode ser resquício de uma infância piromaníaca ou só surpresa com a maravilha da ilusão, o fato é que em perfumaria o cheiro de fumaça me encanta, seja no lado incenso ou madeira queimada. Em Sycomore, Jacques Polge, perfumista da Chanel parte do vetiver para obter esse último efeito.
O vetiver é um capim amado tantos pelos engenheiros agrônomos, que o usam para firmar barrancos, quanto pelos perfumistas, que trabalham com uma extração de suas raízes. E a origem dá a pista — o cheiro é de terra, madeira seca, angular e ossudo, com um aspecto enfumaçado, tradicionalmente ligado a perfumaria masculina.
Jean-Paul Guerlain deixou a barra bem alta quando lançou seu Vétiver em 1959, que mesmo não sendo o primeiro — o da Carven é de 57 –, se tornou o zero contra qual todos os outros são medidos: a definição de obra-prima. Aqui o foco é na madeira com um toque cítrico, luminoso, de impressão austera, bem elegância burguesa francesa. Madame usa Shalimar, monsieur o Vétiver. A partir daqui a coisa vai longe, cada casa tem pelo menos um vetiver no seu catálogo e acabo de pensar numa amiga que tem uma coleção desses perfumes.
Tem cheiro do que?
Polge soma o vetiver com grapefruit, a nossa amada-e-odiada toronja, que olfativamente é uma tia solitária da laranja: sem dúvida é cítrica, mas severa e fechada. E ainda sândalo, que contribui com seu lado amadeirado, cremoso, acrescentando alguns graus de temperatura e um pouco de densidade. A toronja ilumina, de modo mais lunar que solar, o lado enfumaçado do vetiver, contribuindo para um efeito escuro, com todos os mistérios que a fumaça evoca. Um perfume lindo de ponta a ponta, com poderes de atração sobre cartões de crédito mais sensíveis. E custa uma nota. À venda apenas nas lojas Chanel de perfumaria e beleza ou no site.
(Vale um PS sobre a loja: ao lado de cada frasco, embutido no balcão, fica um bastão de cerâmica embebido no perfume, o que evita o desastre da loja cheirando a todo o catálogo de uma vez. Quem já passou na frente de uma loja LUSH vai sentir uma ponta de dor de cabeça e lembrar o que é isso. Claro, você pode borrifar os preferidos em cartões — cartões com o nome do perfume impresso e o frasco desenhado, não uma tirinha de papel — ou na pele para testar. Resolve o transtorno e fica simpático, muito legal.)
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