Apresentei para a vendedora a intenção da visita e começamos pelas melhores apostas, Eau Fraîche e Diorella, cada um no seu papel. Ana Dora cortou o primeiro na hora, para meu discreto desespero — era minha melhor aposta. Diorella foi promovido a um precioso lote de pele no braço direito. Seguimos com Baiser Volé eau de parfum (Cartier), um belo lírio inteiro, flor, pólen e caule, pensando na relação com o Gio. Virginal demais. “É muito menina, sou uma senhora, não posso usar isso.” Como discordar?
Ana Dora consulta o Diorella no braço e diz que é doce. Estranhei a palavra, açúcar não é uma uma primeira impressão do Diorella. Importava é que não era por aí, concordei e seguimos: próxima prateleira, Chanel. Cristalle provoca uma fagulha — O Eau Folle era isso, muito verde, como rolar na grama — e também é promovido ao braço. Talvez eu tenha me apegado demais ao couro e de menos ao verde? E há couros e couros.
Por teimosia apresento Pour Monsieur, a essa altura já sei que é muito austero, mas serve de alguma coisa: Ana também diz que é doce. Doce? Estava levemente amargo, untuoso, aquela cor de musgo cozido que é a definição do chypre. Daria para dizer caramelado mais pela textura colante que pela doçura. Suponho que seja isso, que é o denominador comum com Diorella.
Num esforço de reportagem resolvemos ir a loja da Chanel que vende a linha exclusiva, quis mostrar mais um floral grande, já atirando para todos os lados. No caminho cai o Cristalle — Sumiu! Tem que encostar o nariz para sentir! De fato não é um perfume de grande sillage, o nosso rastro, essa palavra que não consigo gostar. Na loja a coisa fica animada e mais dois conquistam terreno: Beige e 31 Rue Cambon, no alto de cada um dos braços. Beige é um buquê de jasmim e heliotrópio, uma flor miúda. Em perfumaria tem cheiro de amêndoa, com um aspecto cremoso próximo da baunilha. O efeito do perfume é um grande floral com frescor, o heliotrópio entra e sai de foco, achei tudo muito bonito quando conheci, numa outra ocasião. O 31 é barroco, rendado, suntuoso, me deu a impressão de ser “à maneira antiga”, como o N°5 por exemplo, denso e cheio de camadas — e não consegui ir muito além pela falta de energia físico-nasal.
Ana Dora me deu uma carona e fomos papeando, fiquei de conhecer o grupo em que estuda gravura. A certa altura descartou o Beige mas seguiu gostando do 31 Rue Cambon. Nos despedimos no carro, disse para ela acompanhar as fitas olfativas do que tinha gostado mais e atentar ao 31. Ainda parei para um lanche e fazer notas. Chegando em casa me espera uma mensagem da Dora no Facebook:
Lembra do 31 da Chanel? Virou um monstro, me sinto no filme “A Pequena Loja dos Horrores”, forte demais, domina o ambiente, não sobra espaço pra mim.
Participe da conversa:
- Qual perfume você gostava e foi descontinuado? Conseguiu substituir? Por qual?
- Que perfume você sugeriria para Ana Dora no lugar de Eau Folle? E no lugar do Gio?
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